Corinthians, Flamengo e São Paulo reúnem 76 milhões de torcedores, mas
continuam em busca de parceiro principal para estampar marca na camisa
Por Mariana Kneipp Rio
de Janeiro
Uma exposição de marca que atinge diretamente 39% da população brasileira está
disponível no mercado. E ninguém quer. Nos últimos cinco meses, empresas vêm
recusando propostas de patrocínio master para Corinthians, Flamengo e São
Paulo, que juntos somam quase 76 milhões de torcedores no país, segundo
pesquisa de 2010 do Ibope. Além do trio, somente o Náutico está na mesma
situação entre os 20 participantes da Série A.
No início, os altos valores pedidos travavam as negociações. Agora, com o
primeiro semestre passado em branco, os clubes têm dificuldade para negociar
com empresas, que já planejaram o orçamento para o resto do ano. O tempo
passou. Copa do Brasil e estaduais também. E a camisa continua limpa, com
exceção de patrocínios pontuais, de menor valor.
- Houve uma valorização (do espaço nas camisas), que tende a permanecer até
a Copa de 2014. É natural, mas não se pode pedir loucura - explicou o
vice-presidente da BMG, Márcio Alaor, que tem no orçamento atual o patrocínio a
28 clubes (contra 39 de 2011), a um custo de cerca de R$ 40 milhões, uma queda
de 43% em relação ao ano passado.
Uma explicação complementar dada por executivos de empresas é a crise
econômica mundial. Instituições com capital estrangeiro estão estrangulando
seus orçamentos de marketing para controlar as perdas em vendas. Com isso, as
grandes marcas estão esperando pelo próximo ano, véspera da Copa do Mundo, pelo
menos, para voltar a investir no futebol brasileiro.
Clubes enfrentam mercado em baixa
O Corinthians não fala em números oficialmente. No entanto, o
GLOBOESPORTE.COM apurou que a diretoria está pedindo R$ 30 milhões para
estampar frente e verso da camisa. O objetivo maior seria um pacote incluindo
ombros e a área próxima às axilas ao custo de R$ 52 milhões. É mais do que o
dobro do que a Hypermarcas - patrocinador que detinha esses espaços até o fim
do Paulistão (maio) - quer pagar para fazer outro contrato. A empresa, que
antes dava R$ 38 milhões ao Timão, agora quer diminuir para R$ 25 milhões,
influenciada pela saída da 9ine, agência de marketing esportivo que tem como
sócio Ronaldo Fenômeno e era a ponte na negociação.
- Não acho que os custos atuais sejam altos. O valor que se pagava
antigamente pelas propriedades é que era muito baixo. Há um patamar mínimo que
está sendo apresentado no mercado e que condiz com a nossa entrega. Estamos negociando
- afirmou o diretor de marketing do Corinthians, Caio Campos.
O Flamengo tenta não repetir a história da última temporada. Em 2011, foram
sete meses com a camisa limpa até assinar com a Procter & Gamble por um
período de cinco meses, por R$ 5,6 milhões. A parceria com a Traffic, que
pagava parte do salário de Ronaldinho Gaúcho e exigia prioridade em negociações
de patrocínio master, terminou em fevereiro e atrasou o cronograma também para
2012, segundo o diretor de marketing do Rubro-Negro, Marcus Duarte.
Valores de
patrocínios no eixo Rio-São Paulo
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Fluminense
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R$ 90 milhões/ano (Unimed)*
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Palmeiras
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R$ 75 milhões/três anos (Kia)
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Santos
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R$ 20 milhões/ano (BMG)
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Botafogo
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R$ 16 milhões/ano (Guaraviton)
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Vasco
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R$ 16 milhões/ano (Eletrobras)
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* é o valor (aproximado) destinado pelo orçamento da
empresa para pagar direitos de imagem e aquisição de direitos de jogadores. O
dinheiro não vai diretamente para os cofres do Fluminense. Por contrato, a
Unimed deve gastar no mínimo R$ 15 milhões por ano
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- Agora estamos trabalhando com dois cenários em relação a patrocínios. Um
deles é com uma empresa lá de fora, que seria um contrato mais longo, de um ano
e meio, até o fim de 2013. O outro é com duas empresas nacionais, que
assinariam até o fim do Brasileiro. Estamos trabalhando com agências e tentando
vender para essas empresas agora em junho ou julho. As conversas estão
evoluindo - garantiu o dirigente.
Duarte confirmou que o clube quer R$ 20 milhões pelo patrocínio master,
deixando abertura para propostas que chegarem perto deste número. A melhor até
o momento foi de R$ 15 milhões - e recusada. A verba do novo patrocinador seria
somada aos R$ 8 milhões do banco BMG (mangas), R$ 5 milhões da Cosan (barra traseira
da camisa e parte traseira do calção), R$ 3 milhões da Triunfo Logística
(ombros) e R$ 2 milhões da Tim (interior do número da camisa), já presentes no
uniforme do Flamengo.
O São Paulo também pede R$ 20 milhões, apesar de não confirmar oficialmente.
A marca da BMG foi estampada até o fim do Brasileiro de 2011, mas a empresa
alegou questões de reposicionamento e não renovou o contrato. Até o momento, a
melhor proposta foi de R$ 12 milhões.
- Temos sondagens de empresas que nos consultam, mas não houve um acordo que
chegasse ao nível pedido. Temos um dilema atualmente. Se vendermos por um valor
que entendemos que é menor do que vale, jogamos o preço lá para baixo. Para
readquirir o patamar depois ficará muito difícil. Se não conseguirmos para este
ano, temos um fôlego com a receita que gera o nosso estádio. Ela dá condição de
negociarmos com um certo equilíbrio - lembrou Julio Casares, vice de marketing
do São Paulo.
'Estamos indo ao mercado no tempo errado', diz diretor
Embora os números das propostas assustem as empresas, os clubes acreditam
que o maior empecilho para fechar patrocínios neste momento é o
"timing" errado. Os executivos confirmam que o orçamento de 2012 já
está comprometido. Com isso, os dirigentes precisam pensar mais para frente.
- Estamos indo ao mercado no tempo errado. Era para ter aberto em julho ou
agosto (de 2011), para ter uma decisão em novembro e apresentar a parceria em
janeiro, no início do estadual. Devido à exclusividade que tínhamos com a
Traffic, só conseguiremos fechar de forma rápida com uma empresa nacional se
tivermos muita sorte. O ano já começou, os orçamentos estão definidos - afirmou
Duarte.
Mesmo com problemas de "timing", o diretor do Flamengo apresenta
números favoráveis a quem investe em patrocínio. Segundo
Duarte, a Batavo teve em 2010 um retorno de visibilidade
entre R$ 76 e 77 milhões, o que, de acordo com informações do dirigente, é 3,5
vezes maior do que o valor investido. Para ele, nem mesmo as notícias de
imbróglios judiciais, principalmente após a saída de Ronaldinho Gaúcho, podem
sujar a imagem do clube no mercado.
- A força da marca não diminuiu. É como se o Flamengo fosse um planeta, e as
estrelas ficassem passando na sua órbita. Não atingem. Claro que houve uma
perda grande nos negócios com a saída do Ronaldo. Licenciamentos tiveram que
parar porque ele não é mais nosso atleta, e houve uma queda na venda de camisas
com todos os questionamentos e escândalos que foram para a rua. Mas o mercado
já entende que o Flamengo não é apenas um atleta.
Retorno do patrocinador do Tricolor chega a dez vezes
Márcio Alaor, da BMG, concorda com a visão de Duarte e também cita números
positivos da relação com o São Paulo. O contrato foi encerrado apenas porque a
empresa mudou de estratégia. Com a meta de ser mais conhecida pelo público já
alcançada, ela agora diminuiu o número de clubes patrocinados.
- O retorno é espetacular. A cada R$ 1 que investi no São Paulo, tive um
retorno de oito, dez vezes. Eu recomendo, sem dúvida. Saímos apenas por uma
questão de reposicionamento - afirmou, acrescentando que uma pesquisa feita
pela empresa Sport+Market mostrou que a empresa subiu mais de 100 posições e
chegou ao top 3 no ranking de conhecimento de marcas ligadas ao futebol.
O reconhecimento passa pela exposição na mídia. Até a última semana, o
Corinthians teve 30 jogos transmitidos pela TV Globo. O Flamengo somou 14, e o
São Paulo, nove.
'Tem que mostrar o cálculo no papel', diz diretor
Fora do eixo Rio-São Paulo, a parceria do Banrisul com Grêmio e
Internacional já dura 11 anos, tornando-se o segundo patrocínio mais longo,
atrás apenas de Fluminense e Unimed (14 anos). São cerca de R$ 15 milhões
anuais para cada clube. Para o diretor de marketing da empresa, Guilherme
Cassel, independentemente de não ser o melhor momento para a negociação, os
clubes precisam mostrar que valem quanto pedem.
- Em uma mesa sempre é preciso adequar o pedido à necessidade do
interlocutor. O clube pode até valer o que pedem, mas tem que mostrar o cálculo
no papel. Hoje as empresas têm instrumentos, já sentam para negociar com
consciência sobre a relação custo-benefício. Se a proposta não for assim, nem
começam a negociar - afirmou.
O resultado fantástico que tivemos com o patrocínio trouxe
oportunidades. Hoje, temos um fundo de participação nos direitos de jogadores
como Montillo (10%), Paulinho (20%) e Ralf (20%)"
Márcio Alaor, vice-presidente da BMG
O pensamento do Banrisul não é uma exceção no cenário brasileiro atual.
Segundo Ivan Martinho, diretor comercial da empresa de marketing esportivo
Traffic, houve uma mudança de perspectiva nas relações entre marcas e clubes
com o avanço do uso de ferramentas de medição de retorno.
- Antes a decisão era quase 90% emocional. O patrocinador tinha uma relação
pessoal com o clube, era torcedor. À medida que os valores aumentaram muito nos
últimos anos, os executivos precisavam de uma justificativa técnica para reportar
o investimento aos acionistas, mais focada em aumento de vendas, relacionamento
com os clientes, não apenas visibilidade. Houve uma conscientização maior -
afirmou.
As empresas também estão indo além do patrocínio, como é o caso da BMG. O
vice-presidente da empresa conta que atualmente faz práticas mais ligadas ao
relacionamento com o clube e também com o mercado.
- O resultado fantástico que tivemos com o patrocínio trouxe oportunidades.
Hoje, temos um fundo de participação nos direitos de jogadores como Montillo
(10%), Paulinho (20%) e Ralf (20%). No ano passado, vendi nove atletas e tive
um lucro de 72% sobre o valor investido. Além disso, melhoramos a relação com
as diretorias ao possibilitar o adiantamento do pagamento de cotas da TV,
quando necessário - lembrou Márcio Alaor.